Curadoria da Internet

Como levar o Software Livre para quem possui apenas um Smartphone?

Na última sexta-feira, 27 de setembro de 2024, às 18:00, ocorreu a conferência SSLBR - Aniversário do Projeto GNU e o Movimento Software Livre no Brasil, celebrando o 41º aniversário do Projeto GNU. Após exposição de seu contexto histórico, iniciou-se um debate sobre os rumos do Software Livre no Brasil. Neste texto, faço um adendo e proponho uma pauta para o Encontro do Movimento Software Livre no Brasil - Plantaformas, que acontece em 28/09/2024, às 18:00. Ela vai ao encontro com o ponto levantado na última conferência: a necessidade de chegar com o Software Livre na periferia. A questão que levanto tem como ponto de partida o hardware disponível para a maioria da população, que muitas das vezes não possui um PC, mas inevitavelmente tem um smartphone em mãos.

Durante a conferência do dia 27/09/2024, tivemos o início de um debate saudável. Paulo Kretcheu elencou a vantagem do uso de Software Livre (SL) na Educação: economia com licenças e que, uma vez ele seja levado aos estudantes, haverá curiosos que irão se aprofundar. Também afirmou que o SL torna cidadãos mais conscientes. Defende que a Educação é a Solução e que esta educação deve ser emancipadora, trazendo autonomia. Aproveito o ensejo para trazer uma citação do próprio Kretcheu:

Se você quer mexer num Sistema Operacional e ter o controle, não tem como essas duas coisas combinarem com estar tudo pronto; ora, se está tudo pronto, não é você que tem o controle. E, se você quer ter o controle, não estará tudo pronto. Simples assim. Parece aquela história de destino e livre-arbítrio.

(Paulo Kretcheu)

Disponível em: (ao vivo) Instalando e Configurando o i3wm - YouTube - debxp. Aos 25:26. Acesso em: 10 fev. 2024.

Por outro lado, Blau Araújo foca na questão da organização e da consciência de classe. Afirma precisamos chegar na quebrada com o SL, dando oportunidade de aprendizado, para programar, disputar vaga com pessoas que são mais favorecidas financeiramente etc. E é aqui que pego uma carona para fazer meu adendo, que vai ao encontro com esta provocação do Blau. Toco num ponto que raramente vejo ser discutido nos meios que frequento: é possível levar o Software Livre àquelas pessoas que possuem apenas um smartphone? Se sim, como?

Particularmente, nunca gostei de telefone celular e acho que o advento do smartphone em conjunto com a appification, trouxeram grande prejuízo ao protocolo HTTP e às páginas convencionais de internet. Seja por exigir do usuário a instalação de um app ou por questões de responsividade. Também acredito que as redes sociais das big techs são hoje um curral, um cercadinho que limita o campo de visão das pessoas e se torna um canal direto para fake news, desinformação e viés de confirmação. Para piorar a situação, temos o Zero-rating: prática cujas operadoras disponibilizam planos de dados de internet com limites baixos para navegação convencional e ilimitados para apps de redes sociais das big techs.

Todavia, não adianta fechar os olhos para a realidade material: De acordo com levantamento do IBGE: "De 2022 a 2023, a proporção de domicílios com microcomputador recuou de 40,2% para 39,0%. Em 2016, esse percentual era de 45,9% [...] A parcela dos domicílios que tinham telefone móvel celular, por outro lado, apresentou aumento desde 2016 (93,1%), embora em 2022 (96,6%) e 2023 (96,7%) tenha ficado praticamente estável."

Partindo agora para alguns dados empíricos, trago duas situações que vivenciei. A primeira delas, em 2016, quando estava cursando a faculdade. Havia um trabalho em grupo e, durante reunião para verificar o andamento das tarefas atribuídas a cada membro do grupo, descobri que uma colega não possuía um computador. Nem um PC desktop, nem um notebook.

Recentemente, um vizinho trouxe à minha casa um notebook que pegou emprestado de sua cunhada. Queria ajuda para deixá-lo em condições de operação, para fazer um trabalho de faculdade, que envolvia programação com o VS Code, da Microsoft. Como aquela tranqueira de Windows transformara o notebook numa carroça e talvez estivesse com vírus e outros problemas, vi que demoraria horas até compreender qual era o problema. Então, preferi disponibilizar meu próprio PC, desktop para que ele fizesse seu trabalho (que já estava em cima da hora para entregar). Foi então que notei que o garoto não tinha lá muita intimidade com o assunto e não estava criando nada, mas apenas copiando um código pronto da internet. Jeitinhos brasileiros à parte, descobri que ele também não possuía computador próprio e fiquei desconcertado: como é que alguém faz uma faculdade de TI (Sistemas de Informação, salvo engano) sem possuir a principal ferramenta para tanto?

Como pertenço a uma geração anterior, era comum na era pré-smartphone que "todo mundo" tivesse PC em casa, mesmo que em configurações modestas, como o "PC do Milhão". Mas tendo em vista os preços de um smartphone bom ou razoável (que equivalem ao de um PC) e o fato de muitas pessoas só ficarem em casa para dormir, não é de se estranhar a escolha financeira e de conveniência que favorece o smartphone em detrimento do computador.

Diante do exposto, vêm à mente algumas questões:

Portanto, fica a questão: é possível implementar uma iniciativa de Software Livre com o uso de smartphones? Como contornar os pontos supracitados?

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